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Eles juntaram Cássio e a torcida do Flamengo: a história da Autistas Alvinegros

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Por Lucas Faraldo e Victor Consoli

Faixa da torcida Autistas Alvinegras é estendida em jogos do Corinthians no setor Leste da Neo Química Arena

Faixa da torcida Autistas Alvinegras é estendida em jogos do Corinthians no setor Leste da Neo Química Arena

Danilo Fernandes/Meu Timão

Nos jogos do Corinthians, uma faixa já se transformou em marca registrada na Neo Química Arena: é a torcida Autistas Alvinegros. Hoje com centenas de torcedores que lutam por mais inclusão das pessoas com autismo nos estádios e na sociedade, o grupo criado há sete meses já está presente não só nas arquibancadas mas pra além delas também.

Maior ídolo de muitos torcedores, Cássio há pouco tempo usou a camisa da Autistas Alvinegros numa entrevista em que revelou ter uma filhinha diagnosticada no espectro autista. Mais recentemente, foi vez de a torcida corinthiana servir de inspiração para torcedores do Flamengo criarem a Autistas Rubro-Negros às vésperas das finais da Copa do Brasil.

E pouco importa se a causa é defendida pelo goleiro do meu time ou abraçada pela torcida do seu. Entre corinthianos, flamenguistas, palmeirenses e gente de tantos outros times, mais de dois milhões de pessoas são autistas no Brasil – estima-se um caso a cada 110 pessoas no mundo. E a Autistas Alvinegros está aí pra nos contar.

Autistas Alvinegros

A torcida Autistas Alvinegros se autodenomina um movimento de inclusão social, criado no último Dia da Conscientização do Autismo (2 de abril). Hoje o grupo costuma se reunir para assistir aos jogos do Corinthians na arquibancada Leste Inferior da Arena com uma faixa de cerca de oito metros de comprimento estendida em todos os jogos do Timão em casa.

"Eu fiz tipo uma junção do amor pelo Corinthians com a descoberta do autismo, e aí acabou criando os Autistas Alvinegros", resume Rafael Lopes, um dos fundadores da torcida.

Um dos objetivos da Autistas Alvinegros é integrar torcedores com autismo em meio à torcida. Ora, mas por que um movimento para isso?

O autismo, em seus diferentes graus, tem em comum quase sempre a hipersensibilidade sensorial de um ou mais sentidos (audição, visão, tato, paladar e olfato). Assim, independentemente de ser ou não diagnosticada, uma pessoa com transtorno do espectro autista sente dificuldade de interação social.

"Tem pessoas que têm uma hipersensibilidade maior e tem pessoas que têm um pouquinho menor. No meu caso já não é tão avançado, alguns ruídos me incomodam e outros não", conta Rafael, antes de explicar o lado positivo da hipersensibilidade:

"No caso do estádio vem o caso do hiperfoco, como a gente é hiperfocado naquilo, por mais que a gente tenha dificuldade com ruído e com o barulho todo, a gente vai relevando porque está vivendo o hiperfoco ali. A gente se supera".

Torcida Autistas Alvinegros

Danilo Fernandes/Meu Timão

O hiperfoco permite que a pessoa dentro do TEA desenvolva um conjunto de altas habilidades que a tornem expert em alguma atividade. Desde um entusiasta torcedor de futebol a famosos gênios autistas como o compositor Ludwig van Beethoven, o engenheiro e inventor Nikola Tesla, o cineasta Stanley Kubrick, o fundador da Microsoft Bill Gates...

"Ainda assim há problemas, claro. O maior deles é quando termina os jogos, quando vem aquela sobrecarga, que nós chamamos de sobrecarga sensorial", pontua Rafael.

O cenário descrito é de muitos estímulos somados ao cansaço e exemplifica bem as dificuldades que uma pessoa com autismo encara não só em jogos de futebol mas também no dia a dia. Após mais de 90 minutos de superação "na base do hiperfoco", os torcedores saem desgastados do estádio e ainda expostos a barulho, movimentação intensa de pessoas, metrô lotado...

"Isso acaba gerando uma sobrecarga. Todo final de jogo isso é uma coisa que atrapalha, porque a gente chega em casa e tem que se controlar, tem que ter um tempo pra se estabilizar, às vezes gera uma crise de ansiedade", detalha.

E se você não sabia de alguma das informações relatadas até aqui na matéria, saiba que esse é um dos objetivos da torcida criada por Rafael. Pra além de simplesmente reunir torcedores com autismo num jogo do Corinthians, a Autistas Alvinegros também tem como meta levar a diante conhecimento sobre o transtorno. É parte da luta contra o preconceito e a discriminação.

"Nos anos 90, o comportamento diferente gerava bullying, era tido como estranho. Tem o autismo leve, o moderado, tem o mais grave e o severo. Aí você imagina uma criança com autismo severo uns tempos atrás, você pega 20, 30 anos atrás. Uma pessoa com autismo severo era tido como retardado mental por causa do comportamento", descreve Rafael.

"Tem muitos lugares onde os autistas não vão devido ao preconceito, devido ao que as pessoas vão achar. Então a gente quer englobar tudo isso, pra que o autismo seja levado adiante e as pessoas conheçam", completa.

É nesse contexto que a torcida corinthiana levanta a bandeira da Autistas Alvinegras. E não só a torcida corinthiana...

Abraçada por Cássio...

Para além da bandeira quase sempre visível nas transmissões de jogos do Corinthians na televisão, a Autistas Alvinegros também foi divulgada numa camiseta usada pelo goleiro Cássio há dois meses durante entrevista concedida na saída de um jogo do Timão. Foi nessa ocasião em que o ídolo corinthiano revelou que uma de suas filhas foi diagnosticada com autismo.

"Conheci o pessoal (da Autistas Alvinegros). Tenho uma filha autista. A Maria Luiza, de 4 anos tem autismo. Comecei a pesquisar sobre o assunto. Sigo outras páginas de autismo (...) O que eu puder fazer pra ajudar, seja com imagem ou contribuição, vou fazer de coração", contou o Gigante.

"Ele nos revelou (da filha autista) após conhecer nosso movimento", explica Rafael. "Isso foi muito importante pra gente, ele se sentiu à vontade em revelar isso, pois percebeu que não estavam sozinhos nessa. No primeiro contato com a gente ele já nos revelou que a Maria Luiza é autista."

Como no caso da filha de Cássio, o diagnóstico ainda na infância é considerado bastante positivo por especialistas. Quanto mais cedo uma pessoa com autismo for diagnosticada, maiores as possibilidades de buscar ajuda para as dificuldades de interação social, comunicação e comportamento.

É diferente do caso de Rafael. O fundador da Autistas Alvinegros descobriu que tem autismo recentemente, com 35 anos de idade.

"Me pegou desprevenido pelo fato de eu ter todas aquelas dificuldades, as coisas que passei durante a vida, as oportunidades que perdi, as coisas que a gente se priva de fazer. Mas o diagnóstico, ao mesmo tempo que foi frustrante, foi um alivio, porque tinha uma resposta pra tudo aquilo que acontecia. Eu levo mais pelo lado positivo, o lado do alívio, de descobrir quem de fato eu sou."

E abraçada até pela torcida do Flamengo

Hoje a organização da Autistas Alvinegros se dá por grupos em redes sociais. E nesses grupos não há apenas torcedores do Corinthians.

“No inicio do projeto vieram palmeirenses, são-paulinos, pessoal tudo parabenizando. Eles sempre marcavam o clube deles pra ver se o pessoal falava 'e aí? Qual vai ser? Vamos nessa também?'. Então a gente deixou também essa abertura, a gente não ficou fechado só ao clube, essa coisa de clubismo, é uma coisa que a gente quer que vá além", argumenta Rafael.

E foi além. Recentemente, às vésperas das finais da Copa do Brasil e agora em meio a mais um encontro entre Corinthians e Flamengo na temporada, torcedores flamenguistas criaram a Autistas Rubro-Negros. O movimento teve como inspiração justamente o grupo corinthiano.

Autistas Rubro-Negros

Reprodução/Twitter

Hoje já há também menções à luta pela conscientização do autismo em outras torcidas brasileiras como as de Botafogo, Atlético-MG, Fortaleza, Ceará, Sport e Náutico.

Não é a primeira ligação da causa com o Corinthians

"Durante a infância, a adolescência e a fase adulta eu sempre tive algumas dificuldades de relacionamento e interação, na época da escola era bem difícil, eu não conseguia me comunicar direito com as pessoas, tinha dificuldade. Alguns lugares me incomodavam o barulho."

O relato de Rafael ajuda a entender a importância de um espaço criado pelo Corinthians ainda no ano de 2019 na Neo Química Arena. Graças à construção de uma sala revestida com vidro antirruído e com visão para o campo e as arquibancadas, o estádio do Timão se tornou o primeiro inclusivo a pessoas com autismo no futebol brasileiro.

"Principalmente no caso de crianças, pra elas a questão do ruído é muito difícil, elas começam a chorar, entram em crise, porque eles não sabem lidar com a situação, sofrem mais com a hipersensibilidade. Aquela sacada do espaço na Arena é justamente por isso. As crianças não conseguem suportar, então aquele espaço foi criado com essa finalidade, de que as crianças cheguem lá, consigam se distrair", finaliza Rafael.

Marcos Mion é embaixador de espaço destinado a crianças com autismo na Neo Química Arena

Marcos Mion, pai de um menino com autismo, é embaixador de espaço destinado a crianças autistas na Neo Química Arena

Reprodução

Há três anos, portanto, a arena do Corinthians carrega consigo a fitinha do autismo, desenhada com peças de quebra-cabeça. Esse é o principal símbolo do autismo, representando a complexidade da condição e seus diferentes espectros que se encaixam formando o TEA.

A ideia é simbolizar que pessoas autistas são difíceis de compreender (como um quebra-cabeça) e que a "cura" para o autismo é a peça que falta: a inclusão.

Veja mais em: Torcida do Corinthians, Corinthians x Flamengo, Copa do Brasil, Neo Química Arena e Cássio.

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