Venha fazer parte da KTO
x
Torcedores não morrem, apenas se encantam
Walter Falceta

Walter Falceta Jr. é paulistano, jornalista, neto de Michelle Antonio Falcetta, pintor e músico do Bom Retiro que aderiu ao Time do Povo em 1910. É membro do Núcleo de Estudos do Corinthians (NECO).

ver detalhes

Torcedores não morrem, apenas se encantam

Coluna do Walter Falceta

Opinião de Walter Falceta

2.6 mil visualizações 35 comentários Comunicar erro

Torcedores não morrem, apenas se encantam

Douglas e Diego: agora, na arquibancada de cima

Foto: Reprodução

No primeiro tempo do jogo de ontem, perambulei pelas beiradas do território ocupado pelos Gaviões. Um amigo aqui, outro ali. No intervalo, tive o prazer de trocar ideias com Jefferson Martins, fiel das antigas, líder do Grupo Só Corinthians.

Como me adiantasse na conversa, não fui capaz de vencer a fila em busca de um refrigerante. Subi correndo para o segundo tempo e me coloquei naquele vão da Norte entre a Estopim e a P9, onde encontrei outros amigos.

De repente, ouvi os relatos sobre o drama do torcedor Diego da Silva. O rapaz de apenas 23 anos passou mal, teve um síncope cardíaca e veio a falecer logo depois.

Confesso que foi difícil conciliar essa sensação de desconforto com a alegria de ver nosso Timão jogar. Evidente, comemorei o gol do sempre contestado Avelar, mas não com o entusiasmo costumeiro.

A morte de um torcedor sempre se enquadra, pelo menos para mim, na categoria da tragédia.

Em 1999, a serviço do Estadão, eu cobria a final da Libertadores entre Palmeiras e Deportivo Cali. De repente, percebi na arquibancada do velho Parque Antarctica uma agitação, um atropelo, um desespero. Era ainda o primeiro tempo da partida e o coração do taxista Wagner Sposito não suportou a tensão. Mesmo socorrido, o palestrino veio a falecer.

Nessas horas, a gente se impacta, vive a empatia e chora por dentro.

Ocorreu de novo em 2009, quando vascaínos emboscaram corinthianos nas proximidades do Clube Esperia, na Marginal do Tietê. No conflito, assassinaram Clayton Ferreira de Souza, integrante dos Gaviões, um jovem de 27 anos, gentil promotor de vendas em um supermercado.

Naquela ocasião, eu assistia ao jogo nas numeradas. Em dado momento, subi a escada que ladeava o setor da torcida visitante.

Pasmo, vi quando torcedores do cruzmaltino agitaram pertences e documentos subtraídos da vítima, erguidos como troféus da barbárie. Naquele dia, confesso, cogitei de nunca mais pisar num estádio de futebol.

Na semana que passou, nos chocamos todos com a tragédia de Suzano, quando dois entrevados fanáticos, adoradores de armas, invadiram a escola Raul Brasil e se fartaram na maldade.

Um dos estudantes conseguiu escapar, mas retornou para salvar a namorada. Era Douglas Celestino, um garoto generoso, cooperativo, que herdou da mãe a paixão pelo Time do Povo.

Alcançou sucesso em sua missão, mas foi alvejado e veio a falecer. Doeu saber que os assassinos extinguiram a vida de um jovem que sonhava em jogar no nosso Corinthians.

Por seu ato de desapego e bravura durante o ataque em Suzano, não há dúvida de que praticou de maneira formidável o corinthianismo, aquele mesmo dos nossos patronos fundadores de 1910.

Suspeito que o futebol seja um território mágico e misterioso para a passagem espiritual. Por isso, prefiro sempre dizer que os amantes do ludopédio não morrem. Eles se encantam e sobem à arquibancada de cima.

Por isso, em prélios decisivos da turma mosqueteira, sinto a presença de meu pai, o velho Walter, com quem assisti a duas das históricas partidas finais de 1977. Tem como explicar? Não tem.

Assim, esperamos que, de lá do alto, esses fiéis continuem a se emocionar com o futebol, o mais espetacular dos esportes, este que emula e glorifica a própria vida.

Que Clayton, Douglas e Diego encontrem a paz, mas não cessem de torcer. E que a mesma dádiva se estenda ao palmeirense Wagner.

Este jogo, gente, não tem fim. Não se esgota nos 90 minutos, tampouco ao fim de um campeonato.

Veja mais em: Torcida do Corinthians.

Este texto é de responsabilidade do autor e não reflete, necessariamente, a opinião do Meu Timão.

Avalie esta coluna
Coluna do Walter Falceta

Por Walter Falceta

Walter Falceta Jr. é paulistano, jornalista, neto de Michelle Antonio Falcetta, pintor e músico do Bom Retiro que aderiu ao Time do Povo em 1910. É membro do Núcleo de Estudos do Corinthians (NECO).

O que você achou do post do Walter Falceta?